segunda-feira, 25 de julho de 2011

Só os medíocres são felizes

Não gosto de contar minha vida na internet. Na verdade, execro a ideia de blog como um diário virtual. Tenho o bom senso de saber que minha vida interessa aos outros tanto quanto a dos outros me interessa: em nada. Além disso, deixar qualquer coisa registrada na traiçoeira internet, se não impede, certamente dificulta o livre exercício do meu sagrado direito de mentir o tempo todo.
Às vezes, porém, são inevitáveis certas confidências. É preciso explicar como descobri uma verdade universal a partir da comezinha vida cotidiana. E não dá para evitar a questão. Como aconteceu com a volta do Juninho na última postagem, tratar de qualquer outra coisa hoje – dia que cabe a mim no cronograma do blog – seria, no mínimo, falta de sinceridade.
Passo aos fatos: estou no último ano da faculdade de Direito, período em que os alunos se dão conta de que após a formatura - agora tão próxima - só poderão exercer a profissão que escolheram se forem aprovados na temível prova aplicada pela Ordem dos Advogados do Brasil. Caso contrário, serão donos do mais inútil diploma universitário dentre todos os cursos superiores.
O exame, atualmente, funciona da seguinte forma: na primeira fase, há uma prova de 80 questões de múltipla escolha, com quatro alternativas em cada, das mais variadas matérias do Direito. Apenas aqueles que acertarem ao menos 40 questões, a metade, podem fazer a segunda fase. Esta outra tem cinco questões discursivas de uma única área a ser escolhida pelo aspirante à advogado. Aquele que obtém mais de 60% de aproveitamento na segunda prova estará inscrito nos quadros da Ordem, será tratado por Doutor, poderá usar a carteira de identidade vermelha e todo o arreamento dos causídicos de que há tanto tempo atrás já falava o Lima Barreto
É estranho exigir para a prática profissional a habilidade de fazer provas de múltipla escolha, não é coisa que tenha muito a ver com o trabalho do advogado e acaba por reduzir o espaço para a criatividade, dom tão caro para os ignorantes. De fato, a maior vítima da instituição do exame de Ordem é, muito provavelmente, o advogado bufão, símbolo máximo da profissão. Não é o charlatão e o mau-caráter, é apenas aquele pobre coitado que compensa sua absoluta falta de conhecimento jurídico pelo traquejo e a astúcia. Encurralado pelo palavrório do almofadinha do lado contrário, o advogado bufão manda às favas as fórmulas legais que nunca conseguiu aprender, apela a um sentimento maior de justiça e, no meio da sala de audiência, sinceramente, chora.
Essa espécie de advogado é uma figura que muito me fascina, apesar da minha confessada e absoluta falta de talento para alcançar, um dia, tal patamar. É esse o advogado que aproxima a Justiça da gente comum, de onde nunca deveria ter sido tirada. Mas é também uma espécie em extinção, que provavelmente não passará na esdrúxula avaliação, sempre a privilegiar os burocratas.
Mas não quero usar este espaço para falar de advogados, tampouco para reclamar contra a realização do exame. No fim das contas, deve mesmo haver alguma lógica na exigência de conhecimentos mínimos, ainda que de duvidosa utilidade, dos futuros advogados. Aquele a quem o cidadão confia a defesa de seu direito pode muito bem ser um desqualificado que, por obra de professores alucinados, tenha sido aprovado com louvor por diversas vezes durante a faculdade, sem nunca ter comparecido às aulas. Infelizmente, tal tipo de coisas ocorre com certa frequência. Para quem duvida, tenho diversas notas 10,0 em meu boletim capazes de provar o que digo.
O que me interessa tratar aqui é do meu desempenho na primeira fase do último Exame de Ordem, ocorrida há alguns dias atrás. Não saí da prova com o caderno de questões pois para isso era preciso esperar o final das cinco horas de exame, o que a minha malandragem me impediu de fazer. Quando consultei o gabarito da prova, descobri o óbvio: já não mais me lembrava do que havia respondido. Tive, contudo, a certeza de ter acertado 34 questões e errado outras 30. Restavam 16 delas, respondidas não com base no enunciado e nas alternativas, que me soavam como grego, mas em uma intrincada matemática que eu poderia jurar fazer algum sentido na hora da prova.
Existindo quatro alternativas por questão, a média do chute - e eu não poderia esperar nada melhor do que isso - seria acertar apenas 4 entre aquelas 16. A probabilidade de conseguir as 6 que eu precisava para a parcial aprovação era de uma em um milhão, e não me corrijam se eu estiver errado.
Enviei minhas preces a quem houvesse de escutá-las, e, nada mais podendo fazer, abri a cerveja e liguei no futebol.
Hoje saiu o resultado da prova. Dentre as dezesseis fatídicas questões, eu não acertei as seis que precisava, mas sete. Milagrosamente, acertei sete questões e fui aprovado. Antes de terminar essa gelada, desligar o futebol e passar a estudar para não depender da sorte na segunda fase que eu não esperava fazer, venho aqui compartilhar essa história com os meus queridos amigos, com os queridos amigos dos amigos e com os queridos desconhecidos da internet.
Não venho pedir os parabéns nem tampouco contar vantagens. Não poderia fazê-lo. Certamente, muitos outros se preparam por meses, quiçá por anos, em noites de leitura e tardes em cursinhos. Estes tem na sua aprovação a consequência necessária do próprio esforço. Não sou um deles. Não tenho o orgulho dos preparados, mas a paz de espírito dos iluminados. Mais do que pela aprovação em si, minha satisfação está em receber a graça dessa misteriosa força universal. Uns chamam-na de destino, outros de benção, outros ainda, de Deus. Eu a chamo de sorte dos vadios.
Mas o nome é o que menos importa, o fundamental é que essa força existe, ora distribuindo dádivas, ora penas. Aqueles que estão sempre preparados só conhecem as intermitências do Mar Grande na derrota, e o amaldiçoam. Só os medíocres podem sinceramente crer e adorar essa voluntariosa força do desconhecido. E deles será o Reino dos Céus.

2 comentários:

  1. huahauahuahauhauahuah
    chorei de rir. de qlqr forma parabens pela aprovaçao parcial.
    um brinde a sorte dos vadios, em qm sempre podemos confiar

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  2. Vai a merda murilo...nunca vi tu ficar reprovado ou pelo tirar nota baixa em porra nenhuma, é óbvio que tu vai passar...se vou te dar parabens quando vc for do STF!!!rs

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